Reforma
Política no Brasil: A Contra-Reforma Eleitoral de Eduardo Cunha
Introdução
No
Brasil, desde 1994, foram apresentadas 154 PEC’s (Projeto de Emenda
Constitucional) sobre reforma política-eleitoral. Uma média de 7,3
propostas p/ano. Mais da metade das PEC’s tratam de sistema
eleitoral, duração dos mandatos, voto facultativo, coincidência
das eleições e suplência de senador.
Em
nosso País a longevidade do sistema eleitoral proporcional com lista
aberta (70 anos) favorece o status quo, ou seja, a manutenção
das “regras do jogo”. É mister reconhecer que a longa trajetória
de institucionalização de nosso atual sistema eleitoral, em
combinação com a cultura política do eleitor médio (voto na
“pessoa”) constitui um contrapeso importante às aspirações dos
movimentos reformistas. À destarte da agenda reformista que, no
mérito, alberga proposições que tornariam mais democrático nosso
sistema eleitoral como o financiamento público das campanhas, a
combinação de voto em lista pré-ordenada pelos partidos com lista
aberta, dentre outras, defendidas por organizações da sociedade
civil como a OAB, CNBB, etc.
No
entanto numa reforma política-eleitoral seja aqui, ou, em qualquer
país democrático, o que está em jogo é quais os atores políticos
que ganham, e quais os atores que perdem. Noutra perspectiva,
poderíamos refletir se as reformas políticas qualificam e ampliam,
ou, desqualificam e restringem nossas democracias.
Nesse
sentido, para avaliar o sentido e a direção de uma reforma
politico-eleitoral é necessário considerar algumas dimensões. No
geral as reformas dão, ou, não dão conta de três dimensões:
- Equalização da competição política (ex.: redução interferência do poder econômico, etc.);
- Eleições devem refletir a vontade do eleitor (ex.: preferência pelo sistema proporcional em detrimento do sistema majoritário);
- Estabilizar os sistemas políticos (ex.: maior/menor governabilidade)
Em
que pese o poder de agenda do executivo no Congresso brasileiro, em
conformidade com nosso presidencialismo de coalizão, o fato é que
ao longo da experiência de um partido de esquerda na Presidência da
República, não se constituiu uma coalizão reformista majoritária
para bancar uma reforma política-eleitoral, que abarcasse as três
dimensões que vimos acima em sua perspectiva democratizante
(competição equitativa/maior representação do
eleitor/estabilidade democrática).
Além
disso, a ausência de pressões externas tendem a conservar o atual
sistema eleitoral. Em pesquisas mais ou menos recentes, 70% dos
eleitores não fazem a menor idéia do que trata a reforma política,
“mas 80% são favoráveis a ela”!
A
Reforma Política-Eleitoral em 2015 no Congresso
No
início do ano legislativo o deputado Eduardo Cunha(PMDB)- já na
condição de Presidente da Câmara Federal - indicou o deputado
Marcelo de Castro (PMDB) para ser o relator da Comissão Especial da
Reforma Política. À Comissão foi dada 90 dias para produzir o
relatório.
Nesses
90 dias a Comissão reuniu com presidentes dos partidos, cientistas
políticos, representantes do TSE e 18 unidades da federação foram
visitadas pela Comissão. O diagnóstico da Comissão foi de que
nosso atual sistema político padece de problemas tais como:
- Custos exorbitantes das campanhas (majoritárias e proporcionais);
- Número excessivo de partidos;
- Partidos frágeis;
- Transferência de votos entre os candidatos (jogo oculto do eleitor);
- Disputa eleitoral interna;
- Eleições personalizadas;
- Relações pouco republicanas c/financiadores das campanhas, entre os pincipais.
Ocorreu
que quando a Comissão começava a discutir o relatório e suas
proposições (distritão, manutenção das doações empresariais,
fim da reeleição p/cargos executivos, coincidência das eleições,
fim das coligações nas proporcionais, cláusula de desempenho,
etc.), o presidente da Câmara - de forma arbitrária - destituiu o
relator, e encaminhou a votação direta para o plenário;
O
quadro abaixo registra a situação atual da reforma eleitoral. Nesse
sentido vale a pena comparar as propostas. Lembremos que a agenda da
OAB, CNBB, PT e outros para a reforma ( lista pré-ordenada e
fechada, financiamento público exclusivo, fim das coligações,
cláusula de desempenho) foi derrotada. No momento o que está em
disputa é a proposta da Comissão Especial e a Contra-Reforma do
deputado Cunha ;
Propostas
|
OAB, CNBB. P T e outros
|
Comissão Especial R.P.
|
Contra-Reforma do Cunha
|
Resultado Efetivo-Parcial
na Câmara
|
Sistema Eleitoral
|
Voto em Lista Fechada
|
Distritão
|
Distritão
|
Proporcional c/Lista Aberta (Ñ
Muda!)
|
Financiamentode Campanha
|
Público Exclusivo
|
Permite doações empresariais
aos partidos (lei ordinária regulamenta)
|
Permite doações empresariais
aos partidos (constitucionaliza)
|
C.R. do Cunha
|
Coligações
|
Fim nas Proporcionais
|
Fim nas Proporcionais
|
Mantém sistema atual
|
C.R. do Cunha
|
Cláusula de Barreira
|
A favor
|
1% em
2018
2% em 2022
|
Basta eleger 1 deputado
|
C.R. do Cunha
|
Reeleição Cargo Executivo
|
Fim da reeleição
|
Fim da reeleição
|
Fim da reeleição
|
Consenso
|
Duração Mandato
|
4 /5 anos
|
5 anos
|
4/5 anos
|
Indefinido
|
Coincidência das Eleições
|
Mantém a atual periodização
|
Coincide em 2022 c regra de
transição
|
Indefinido
|
|
Suplência Senado
|
Diminui
|
Diminui
|
Diminui
|
Indefinido
|
Contudo,
se as intenções do deputado Eduardo Cunha se concretizarem é
possível predizer que até agora nosso sistema eleitoral tende a
manter suas características mais criticadas (lista aberta com
competição interna/coligação nas proporcionais/personalização),
acrescidas de um a) retrocesso e de mais b)
complexidades para o eleitor.
O a)
retrocesso, caso confirmado, será a constitucionalização das
doações empresariais, o que tornaria sem efeito uma possível
decisão em contrário pelo STF. É como se aceitássemos que um
punhado de 10 a 15 grandes empresas (responsáveis por R$ 1,3 bi em
doações p/a campanha presidencial) constituíssem a maioria dos
representantes do “povo” no Congresso Nacional. Está claro que o
deputado Eduardo Cunha quer a constitucionalização da influência
do poder econômico nos processos eleitorais!
E b)
a coincidência de todas as eleições como efeito tenderá a
nacionalizar as questões locais, ou, inversamente, municipalizar as
questões nacionais, o que tornará mais complexo e custoso o
processo de decisão para o cidadão. O eleitor que já convive com
um cenário de escassa informação, e oferta excessiva de candidatos
(em 2012 foram mais de 500 mil em todo o País para o cargo de
vereador). Atentemos que a coincidência das eleições interessa ao
status quo, pois desobriga os deputados federais a , pelo
menos, de dois em dois anos em articular os distintos níveis
federativos (federal/estadual/municípios).
Posto
que a votação em primeiro turno na Câmara não foi concluída, e
que resta ao Senado revisar em dois turnos o processo, parece-nos
sensato e um tanto quanto esperançoso as manifestações do
presidente do Senado, Senador Renan Calheiros (PMDB) , que criticou
as votações na Câmara pois não limitaram as doações
empresariais para as campanhas eleitorais e não aprovaram o fim das
coligações nas proporcionais. Além disso Renan defendeu a
relevância em arbitrar uma cláusula de barreira para que os
partidos tenham acesso ao fundo partidário e a veiculação de
propaganda politica na rede aberta de televisão. Alguns podem
criticar que o presidente do Senado está a defender uma agenda
mínima somente! Contudo, por vezes e por conta da correlação de
forças políticas, a agenda mínima é a máxima!
Ilton
Freitas
Cientista
Político
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