sexta-feira, 5 de junho de 2015

Reforma Política no Brasil: Sinais de Retrocesso




Reforma Política no Brasil: A Contra-Reforma Eleitoral de Eduardo Cunha


Introdução
No Brasil, desde 1994, foram apresentadas 154 PEC’s (Projeto de Emenda Constitucional) sobre reforma política-eleitoral. Uma média de 7,3 propostas p/ano. Mais da metade das PEC’s tratam de sistema eleitoral, duração dos mandatos, voto facultativo, coincidência das eleições e suplência de senador.



Em nosso País a longevidade do sistema eleitoral proporcional com lista aberta (70 anos) favorece o status quo, ou seja, a manutenção das “regras do jogo”. É mister reconhecer que a longa trajetória de institucionalização de nosso atual sistema eleitoral, em combinação com a cultura política do eleitor médio (voto na “pessoa”) constitui um contrapeso importante às aspirações dos movimentos reformistas. À destarte da agenda reformista que, no mérito, alberga proposições que tornariam mais democrático nosso sistema eleitoral como o financiamento público das campanhas, a combinação de voto em lista pré-ordenada pelos partidos com lista aberta, dentre outras, defendidas por organizações da sociedade civil como a OAB, CNBB, etc.
No entanto numa reforma política-eleitoral seja aqui, ou, em qualquer país democrático, o que está em jogo é quais os atores políticos que ganham, e quais os atores que perdem. Noutra perspectiva, poderíamos refletir se as reformas políticas qualificam e ampliam, ou, desqualificam e restringem nossas democracias.
Nesse sentido, para avaliar o sentido e a direção de uma reforma politico-eleitoral é necessário considerar algumas dimensões. No geral as reformas dão, ou, não dão conta de três dimensões:
  1. Equalização da competição política (ex.: redução interferência do poder econômico, etc.);
  2. Eleições devem refletir a vontade do eleitor (ex.: preferência pelo sistema proporcional em detrimento do sistema majoritário);
  3. Estabilizar os sistemas políticos (ex.: maior/menor governabilidade)


Em que pese o poder de agenda do executivo no Congresso brasileiro, em conformidade com nosso presidencialismo de coalizão, o fato é que ao longo da experiência de um partido de esquerda na Presidência da República, não se constituiu uma coalizão reformista majoritária para bancar uma reforma política-eleitoral, que abarcasse as três dimensões que vimos acima em sua perspectiva democratizante (competição equitativa/maior representação do eleitor/estabilidade democrática).
Além disso, a ausência de pressões externas tendem a conservar o atual sistema eleitoral. Em pesquisas mais ou menos recentes, 70% dos eleitores não fazem a menor idéia do que trata a reforma política, “mas 80% são favoráveis a ela”!




A Reforma Política-Eleitoral em 2015 no Congresso
No início do ano legislativo o deputado Eduardo Cunha(PMDB)- já na condição de Presidente da Câmara Federal - indicou o deputado Marcelo de Castro (PMDB) para ser o relator da Comissão Especial da Reforma Política. À Comissão foi dada 90 dias para produzir o relatório.
Nesses 90 dias a Comissão reuniu com presidentes dos partidos, cientistas políticos, representantes do TSE e 18 unidades da federação foram visitadas pela Comissão. O diagnóstico da Comissão foi de que nosso atual sistema político padece de problemas tais como:
  • Custos exorbitantes das campanhas (majoritárias e proporcionais);
  • Número excessivo de partidos;
  • Partidos frágeis;
  • Transferência de votos entre os candidatos (jogo oculto do eleitor);
  • Disputa eleitoral interna;
  • Eleições personalizadas;
  • Relações pouco republicanas c/financiadores das campanhas, entre os pincipais.
Ocorreu que quando a Comissão começava a discutir o relatório e suas proposições (distritão, manutenção das doações empresariais, fim da reeleição p/cargos executivos, coincidência das eleições, fim das coligações nas proporcionais, cláusula de desempenho, etc.), o presidente da Câmara - de forma arbitrária - destituiu o relator, e encaminhou a votação direta para o plenário;
O quadro abaixo registra a situação atual da reforma eleitoral. Nesse sentido vale a pena comparar as propostas. Lembremos que a agenda da OAB, CNBB, PT e outros para a reforma ( lista pré-ordenada e fechada, financiamento público exclusivo, fim das coligações, cláusula de desempenho) foi derrotada. No momento o que está em disputa é a proposta da Comissão Especial e a Contra-Reforma do deputado Cunha ;
Propostas
OAB, CNBB. P T e outros
Comissão Especial R.P.
Contra-Reforma do Cunha
Resultado Efetivo-Parcial na Câmara
Sistema Eleitoral
Voto em Lista Fechada
Distritão
Distritão
Proporcional c/Lista Aberta (Ñ Muda!)
Financiamentode Campanha
Público Exclusivo
Permite doações empresariais aos partidos (lei ordinária regulamenta)
Permite doações empresariais aos partidos (constitucionaliza)
C.R. do Cunha
Coligações
Fim nas Proporcionais
Fim nas Proporcionais
Mantém sistema atual
C.R. do Cunha
Cláusula de Barreira
A favor
1% em 2018
2% em 2022
Basta eleger 1 deputado
C.R. do Cunha
Reeleição Cargo Executivo
Fim da reeleição
Fim da reeleição
Fim da reeleição
Consenso
Duração Mandato
4 /5 anos
5 anos
4/5 anos
Indefinido
Coincidência das Eleições
Mantém a atual periodização
Coincide em 2022 c regra de transição
Coincide em 2022 c regra de transição
Indefinido
Suplência Senado
Diminui
Diminui
Diminui
Indefinido







Contudo, se as intenções do deputado Eduardo Cunha se concretizarem é possível predizer que até agora nosso sistema eleitoral tende a manter suas características mais criticadas (lista aberta com competição interna/coligação nas proporcionais/personalização), acrescidas de um a) retrocesso e de mais b) complexidades para o eleitor.
O a) retrocesso, caso confirmado, será a constitucionalização das doações empresariais, o que tornaria sem efeito uma possível decisão em contrário pelo STF. É como se aceitássemos que um punhado de 10 a 15 grandes empresas (responsáveis por R$ 1,3 bi em doações p/a campanha presidencial) constituíssem a maioria dos representantes do “povo” no Congresso Nacional. Está claro que o deputado Eduardo Cunha quer a constitucionalização da influência do poder econômico nos processos eleitorais!
E b) a coincidência de todas as eleições como efeito tenderá a nacionalizar as questões locais, ou, inversamente, municipalizar as questões nacionais, o que tornará mais complexo e custoso o processo de decisão para o cidadão. O eleitor que já convive com um cenário de escassa informação, e oferta excessiva de candidatos (em 2012 foram mais de 500 mil em todo o País para o cargo de vereador). Atentemos que a coincidência das eleições interessa ao status quo, pois desobriga os deputados federais a , pelo menos, de dois em dois anos em articular os distintos níveis federativos (federal/estadual/municípios).
Posto que a votação em primeiro turno na Câmara não foi concluída, e que resta ao Senado revisar em dois turnos o processo, parece-nos sensato e um tanto quanto esperançoso as manifestações do presidente do Senado, Senador Renan Calheiros (PMDB) , que criticou as votações na Câmara pois não limitaram as doações empresariais para as campanhas eleitorais e não aprovaram o fim das coligações nas proporcionais. Além disso Renan defendeu a relevância em arbitrar uma cláusula de barreira para que os partidos tenham acesso ao fundo partidário e a veiculação de propaganda politica na rede aberta de televisão. Alguns podem criticar que o presidente do Senado está a defender uma agenda mínima somente! Contudo, por vezes e por conta da correlação de forças políticas, a agenda mínima é a máxima!






Ilton Freitas
Cientista Político

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