quarta-feira, 5 de setembro de 2018

Bolsonaro e a Cultura Anti-Democrática, Junho de 2013 e Crise do PSDB

| por: Ilton Freitas


Os “grandes arquitetos” do golpe permitiram que bufões como Bolsonaro adquirissem notoriedade midiática, porquanto se demonstraram úteis na tarefa de insultar e promover a violência e o ódio contra o governo Dilma, o PT e sua principal liderança, o presidente Lula. A rigor a candidatura de Bolsonaro se tornou expressão e desaguadouro de três fenômenos combinados. Um que diz respeito a uma certa cultura política do País e outros dois de natureza conjuntural.




O jornal on-line Gazeta do Povo[1] publicou uma “média” das pesquisas de intenção de voto para Presidente, realizada por cinco institutos[2],  abrangendo os meses de junho a agosto. No gráfico com a presença do ex-Presidente Lula verificamos a confirmação de sua liderança com a média de 32% (trinta e dois) de intenção de voto.  Podemos predizer que a um pouco mais de um mês do pleito, e à destarte da campanha eleitoral televisiva, que Lula preserva uma sólida e inamovível maioria eleitoral no primeiro turno. Observemos que pela média dos institutos, o deputado federal Bolsonaro aparece consolidado no segundo lugar, e com pouco risco de ser alcançado por Alckmin (com apenas 4% na média de intenção de voto), ou outro competidor à direita.



Contudo, o gráfico seguinte sem a presença de Lula nos traz importantes informações. Primeiramente verificamos que os votos em branco ponteiam, e saltariam de 15% (quinze) para 26% (vinte e seis). Portanto, boa parte das intenções de voto em Lula migrariam - num primeiro momento - para a opção, voto em branco. A outra novidade é a intenção de voto em Haddad, confirmado como candidato à vice na chapa com Lula presidente. Haddad herdaria 13% (treze) da intenção de voto em Lula. E os demais 6% (seis) de intenção de voto se dividiriam entre as candidaturas de Ciro, Marina e Boulos. Destaco que Bolsonaro se mantém consolidado em segundo lugar nesse cenário com a mesma intenção de voto média, isto é, 20% (vinte pontos percentuais). 



Entrementes, há que se aguardar pelo veredito das cortes sobre o direito de Lula concorrer. Após a impugnação do TSE ainda cabem recursos. O fundamental é que a Comissão de Direitos Humanos da ONU compreendeu que o ex-Presidente não pode ser impedido de concorrer, e que o País é signatário de protocolo - aprovado no Congresso Nacional - em que reconhece e se subordina às normas internacionais de direitos humanos. Sendo assim, o mínimo que se espera do judiciário – sobretudo o STJ e o STF -  é que Lula tenha salvaguardado seu direito de concorrer. Caso o judiciário enverede pela via do golpe e não reconheça o direito do presidente Lula, tudo indica que ocorrerá uma migração massiva de intenção de voto em Haddad. O que o conduzirá para o segundo turno com reais possibilidades de vitória sobre Bolsonaro. Sim, pelas projeções Bolsonaro estará no segundo turno! 

Como Justificar o “Fenômeno” e a Aberração Bolsonaro


Os “grandes arquitetos” do golpe permitiram que bufões como Bolsonaro adquirissem notoriedade midiática, porquanto se demonstraram úteis na tarefa de insultar e promover a violência e o ódio contra o governo Dilma, o PT e sua principal liderança, o presidente Lula. A rigor a candidatura de Bolsonaro se tornou expressão e desaguadouro de três fenômenos combinados. Um que diz respeito a uma certa cultura política do País e outros dois de natureza conjuntural.

No que concerne à cultura política, o instituto Latinobarômetro, com sede no Chile, faz desde os anos noventa mensurações sobre a cultura política democrática nos países latino-americanos. Numa série histórica importante de pesquisas, no caso brasileiro, se revela que 19% dos cidadãos[3] em 2016, preferiam um regime autoritário como alternativa à democracia. E conforme o Latinobarômetro, havia 41% de indiferentes (tanto faz, o regime pode ser democrático, ou, autoritário). Em 2013, para fins de comparação, os que preferiam um regime autoritário eram pouco mais de 11%, e os indiferentes perfaziam vinte pontos (20%). Portanto, candidaturas do “tipo Bolsonaro” possuem uma base tradicional de apoio na sociedade brasileira, perfazendo quase a quinta parte do eleitorado. Essa vertente eleitoral conservadora é relevante no colégio eleitoral mais importante que é a região Sudeste, e também na região Sul do País, locus de latifúndios vinculados ao agronegócio. Mas apenas o eleitorado conservador não explica “in totum” o fenômeno Bolsonaro, e sua posição consolidada nas pesquisas com mais de 20% nas intenções de voto. 

Causalidades conjunturais geopolíticas e eleitorais auxiliam na compreensão do “bolsonarismo” e sua expressão atual! Do ponto-de-vista geopolítico, sustento que Bolsonaro é uma das resultantes das famigeradas jornadas de “junho de 2013”. As manipuladas manifestações multitudinárias contra “tudo e todos”, e contra aqueles que “não nos representam” foram transformadas em espetáculo midiático, com o claro propósito de desestabilizar o governo da então presidente Dilma, atendendo a interesses externos e das oligarquias nativas. É muita semelhança, para não dizer outra coisa, que tanto na forma (pacífico/violenta) quanto no conteúdo (anti-política e anti-partidário) as “manifestações” fizeram nos lembrar as ditas “Primaveras Árabes” (Egito, 2011), e outros processos de desestabilização de governos no leste europeu e em algumas das ex-repúblicas soviéticas (Geórgia/2003 e Ucrânia/2004), que ficaram conhecidos como “Revoluções Coloridas”.  A rigor as “Revoluções Coloridas” são aplicações concretas do manual de desestabilização de governos não-alinhados aos interesses imperiais de um ex-professor de Harvard, e colaborador íntimo da CIA norte-americana, o senhor Gene Sharp[4]. 

Lembremos que no início de 2013, a aprovação popular do governo Dilma ultrapassava setenta por cento (70%). Mas no final daquele ano a aprovação despencou ficando em trinta pontos (30%). No embalo das jornadas de junho, o movimento do “Não Vai Ter Copa” em 2014, e as manifestações “coxinhas” de verde-amarelo de 2015 e 2016, permitiram à extrema-direita nativa “ganhar as ruas” com a devida legitimação e glamourização conferida pela mídia-empresa, sobretudo a Rede Globo. O fenômeno foi bem analisado pelo sociólogo Jessé Souza. Ou seja, os fascistas e proto-fascistas se permitiram desfraldar seus preconceitos e violências de todo o tipo contra pobres e negros, pois afinal de contas foram convencidos pela mídia e por redes sociais de que “não eram canalhas”![5] Por óbvio, e por uma questão de espaço não vou aprofundar por aqui a vinculação de Bolsonaro e sua força eleitoral recente com as manifestações proto-fascistas de junho de 2013 em diante. Oportunamente retomaremos o tema, posto que setores de esquerda até hoje não compreenderam o que estava em jogo em 2013, e consideram aquelas manifestações como progressistas (sic).

A respeito do elemento conjuntural eleitoral todas as projeções indicam que Bolsonaro estará no segundo turno, e será derrotado. Posto que sua rejeição é a maior entre todos os candidatos à presidência[6]. A expressão eleitoral de Bolsonaro resulta como vimos de 1 - fatores culturais, 2 - geopolíticos e do 3 -  golpe contra o governo Dilma. E aqui reside a contradição criada pelos golpistas e os patrocinadores dos ataques contra a democracia e a soberania nacional. O fruto político-eleitoral do golpe se chama Bolsonaro, pois o PSDB que seria o seu principal beneficiário naufragou junto com Aécio, e a alternativa Alckmin não reage e sequer supera a intenção de voto em Lula no estado de São Paulo, conforme pesquisas[7]. A direita tradicional não produziu nenhuma alternativa eleitoral competitiva, e sua agenda de recolonização do País e de ataque aos trabalhadores está sendo defendida por um candidato medíocre e delinquente, a aberração Bolsonaro. Ao menos fica demonstrado - mais uma vez - com Bolsonaro que fascismo e neoliberalismo não são antípodas, são putrefações políticas e sociais urdidas pela barbárie e pelos adversários da civilização. 

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[1] https://especiais.gazetadopovo.com.br/eleicoes/2018/pesquisas-eleitorais/

[2] Datafolha, Ibope, MDA, DataPoder360, Paraná Pesquisas e Ipespe 

[3] Vide relatório da pesquisa realizada em 2016 em www.latinobarometro.org/

[4] Autor da obra “Da Ditadura à Democracia”, publicada em 1994. Traduções do livro foram distribuídas em grande escala por ONGs em países árabes e subsidiaram ações desestabilizadoras de governos não alinhados, ou, que se rebelaram contra os interesses norte-americanos na região. N.A

[5] O argumento foi bem desenvolvido por Jesse Souza em “A Radiografia do Golpe”, em 2016, publicada pela LeYa. N.A.

[6] https://www.infomoney.com.br/mercados/politica/noticia/7597438/bolsonaro-ve-rejeicao-chegar-a-61-e-risco-de-voto-util-contrario-crescer-mostra-xpipespe

[7] Vide Datafolha publicada pela Folha On-Line em 22/08/18 no endereço https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/08/bolsonaro-ultrapassa-lula-no-df-e-petista-chega-a-60-em-pe-aponta-datafolha.shtml



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